Mais um Domingo igual?

Manhã de Domingo, toca o despertador, dia de descanso para muitos, mais um dia de trabalho para outros, uma manhã a empregado de balcão para mim. Lá fora o sol ainda tem poucas horas de vida, mas já brilha com todo o seu esplendor. O céu, esse está limpo e azul, o que faz prever um magnífico Domingo. Poderia ser o porquê do sorriso estampado na minha cara e da felicidade que me preenche por dentro apesar da hora, mas não é, e por uma simples razão, logo á tarde há futebol na “Pedreira”, joga o meu clube, razão mais que suficiente para me fazer sorrir e renegar tudo o resto para segundo plano. Como não podia deixar de ser, visto uma camisola vermelha com mangas brancas e lá vou trabalhar. No curto caminho, encontro alguns conhecidos que me abordam e expressam a sua felicidade por logo irem ver jogar o clube mais representativo da cidade. Não é um hábito irem ao futebol, não por não gostarem de futebol, ou por apoiar outra equipa que não o Braga, mas porque nem sempre conseguem chegar ao fim do mês com mais de 1 euro no bolso... Já no local de onde devo estar até perto das 13 horas, reparo que as conversas giram todas em volta do jogo onde todos apenas esperam um resultado. Por entre as conversas lá consigo apanhar alguém a dizer que hoje vai levar a mulher e os 3 filhos ao estádio, outro que convidou uns amigos de fora de Braga para virem ao Estádio Municipal de Braga apreciar a sua beleza e ver o Sporting Clube de Braga jogar, outro ainda vai fazer uma surpresa à mãe (por ser o dia dedicado a ela) e levá-la ao estádio, ela que sofre sempre em casa agarrada ao relato que vai passando no rádio, mas mesmo assim torce por uma vitória do clube da cidade que a viu nascer. Todos levavam alguém pela primeira vez, e todos falavam em ir vestidos de vermelho. Do outro lado do balcão começo eu a sonhar em ver o estádio cheio e uma grande vitória do clube de todos nós, sonho prontamente interrompido pelo pedido de alguém. Em cada pessoa que vejo vestida de vermelho penso se também irá ver o espectáculo, mas não me atrevo a perguntar... O que é certo é que uma anormal quantidade de pessoas se veste de vermelho neste dia da mãe, ou talvez seja eu que estou mais atento a isso. Começa a nascer em mim, perto do estômago uma espécie de dor, é ânsia em chegar a hora do jogo... Olho para o relógio mas ele teima em andar devagar, muito devagar, nem um quarto de volta deu desde a última vez que olhei para ele... Após umas largas dezenas de clientes me terem dito que logo de tarde pode ser que nos voltemos a encontrar, o relógio lá faz o favor de dar umas voltinhas... Saio no fim do almoço para entreter o pensamento e tentar deixar de olhar para o relógio que voltou a abrandar o ritmo, ao contrario do meu coração, esse acelera cada vez mais. É inútil tentar distrair a mente de algo que amámos com tanta força, pois na minha cabeça só o jogo tem lugar agora. Continuo a reparar nas pessoas vestidas de vermelho e começo a reparar agora que muitas delas se fazem acompanhar de um cachecol, que não é para cobrir o pescoço do frio, que esse não se faz sentir, é para apoiar o clube cá da cidade. Todos se dirigem para o estádio, e eu, que já não aguento mais esta ânsia, sigo-lhes os passos. Hoje há uma movimentação anormal no mesmo sentido em que eu vou, algo de extraordinário se adivinha... Sento-me na cadeira de sempre ainda antes do habitual aquecimento das equipas, e olhando em volta, reparo que as bancadas estão já mais cobertas que no início de certos jogos. Sinto o primeiro arrepio ao imaginar as pessoas que ainda se dirigem para lá e ainda vão ocupar os lugares vazios, e começo a adivinhar uma enchente, um mar vermelho... Já mais perto do apito inicial reparo que nunca esteve tanta gente na Pedreira para apoiar o Braga! Para alguns este jogo tem um sabor especial, existe nele uma sede de vingança pelas duas derrotas sofridas este ano, contra a mesma equipa que hoje terá de lutar contra o apoio de cerca de trinta mil vozes de incentivo aos nossos bravos... É esta sede de vingança e esta vontade tremenda de vencer que me faz gritar golo com toda a força que conseguia, quando vejo pela primeira vez a bola a fazer abanar as redes da baliza contrária... Estava tudo perfeito até que perto do fim uma tristeza se aproxima de mim querendo estragar a festa, mas eis que, contra a crença de muitos dos presentes, um remate com fé, força, garra e vontade faz a bola beijar o fundo da baliza, faz erguer um estádio, faz matar a sede de vingança de muitos faz encher o coração de alegria de outros e faz-me perder a total noção das coisas de tal modo que dei comigo com uma grande parte dos músculos contraídos, um punho fechado de raiva, e um abraço forte a alguém que o merecia. Consigo inexplicavelmente abstrair-me de tudo isto, para durante cerca de dois segundos imaginar aquele jogo como sendo o jogo do título, aquele golo como sendo o decisivo e aqueles adeptos como sendo os normalmente presentes, apenas um arrepio ainda mais forte me faz voltar a mim e lembrar com um enorme desejo de concretização esse sonho... E assim foi mais um Domingo, mais um Dia da Mãe que tinha tudo para ser igual a tantos outros, mas acabou por ter tudo para ser diferente e marcante...

Deixo-vos aqui mais um excelente texto da autoria do Rui Xavier e retirado do blog Nemec thoughts, desta vez sobre o último Domingo em que tivemos um EMB a abarrotar.

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